quarta-feira, 13 de julho de 2011

Vivências de Planejamento e de Aproximação entre Escola, Família e Comunidade

Samantha Ferraz Lobo Cavalcanti

Sandra C. F. de S. de Almeida


Se podes olhar, vê.

Se podes ver, repara.

(José Saramago)


Este relato tanto traz aspectos da realidade de trabalho desta ETP como também a fundamentação teórica deste. Citamos autores de diferentes vertentes, já que acompanhando ALVES (2002), para compreender os múltiplos cotidianos da escola é preciso virar de ponta cabeça, ou seja, pensar nas redes de conhecimento, considerando que cada teoria tem seus limites e que podemos pensar em outras lógicas que estão nas práticas, aproximando conhecimentos e traçando analogias, trazendo caminhos já percorridos e indicando novas possibilidades.

Neste sentido, vamos ao encontro de Saramago (1995) com a epígrafe que introduz este texto: Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara. O autor, a partir da ficção, propicia a reflexão sobre a desumanização que há em nossa sociedade e nos sensibiliza quanto a nossa responsabilidade mútua.

Inspiradas na premissa de resgate de nossa humanidade em comum e movidas em modificar o distanciamento entre eu-outro, a Equipe Técnico-Pedagógica da E. M. Cantagalo vem trabalhando junto com a direção da escola, professores, alunos(as), responsáveis, funcionários(as), comunidade, Fundação Municipal de Educação de Niterói e tantos outros segmentos da sociedade na construção de uma escola comprometida com o conhecimento que gera emancipação (SANTOS, 2002). Recém-chegadas a esta Fundação e encaminhadas à escola já citada, nos deparamos com uma realidade escolar desafiadora e comum a muitas outras escolas públicas: um alto índice de crianças ainda não alfabetizadas, um espaço escolar esvaziado da produção das crianças, pouca participação das famílias e, principalmente, a violência que as crianças sofrem fora e dentro da escola. Sobre a

violência que acontece fora da escola, as histórias que ouvimos apontam na direção de crianças adultorizadas e totalmente desrespeitadas em sua infância. Já a violência que ainda se dá no espaço escolar, esta percorre caminhos ora visíveis, ora camuflados.

Diante deste quadro, a nossa primeira opção foi a de não negar o que está a nossa frente, ver aquilo que podemos olhar. Assim, vemos as contradições e os conflitos que emergem em nossa micro e macro-estrutura social, de acordo com o que o nosso olhar, mais ou menos sensível e instruído, nos ajuda a ver. E ver para agir.

Nossas ações de supervisão e orientação no/com o cotidiano da escola têm se voltado mais em três aspectos: o incentivo à formação de professoras críticas e pesquisadoras; a abertura da escola aos responsáveis; e a valorização dentro da escola de diferentes formas de expressividade, iniciativas, construção coletiva e diálogo.

Até o momento, o incentivo à formação de professoras críticas e pesquisadoras vem acontecendo das seguintes formas:

• participação das professoras em seminários, congressos, eventos acadêmicos, com posterior debate no grupo e a produção de textos (buscamos intensificar na escola as contribuições desses eventos);

• leitura e discussão de textos de autores pós-modernos, sócio-interacionistas, marxistas...

• elaboração de memorial auto-biográfico (Nóvoa, 2000), onde cada professor reflete sobre sua trajetória pessoal e profissional e compartilha suas experiências, expectativas, angústias, sucessos, erros com todo o grupo;

• visita a nossa escola de professores acadêmicos, como a da professora Lea Calvão, que nos trouxe um almanaque sobre Niterói (2003), onde aparecem memórias, contos populares, curiosidades, mitos, a tradição oral...

Especificamente, esta visita veio nos ajudar a pensar Niterói, lançando o nosso olhar sobre suas várias avenidas, monumentos, museus, para uma apropriação responsável, poética e criativa da cidade.

• visita exploratória desta ETP com as professoras a museus, preparatória de atividades curriculares. Por exemplo, a visita ao Museu Arqueológico de Itaipu, fundamental para a organização do trabalho escolar na perspectiva do resgate da identidade local e da aproximação do sujeito ao espaço histórico e natural, de maneira mais consciente e integrada;

• e, influenciadas pela dinâmica da Coordenação Técnico-Pedagógica da FME, iniciamos a Socialização de Fazeres Cantagalo, espaço agendado, em que cada professora apresenta ao grupo alguma atividade ou reflexão decorrente de sua prática em sala de aula.

Desta forma, o horário de planejamento semanal tem possibilitado muitas de nossas ações. Sabemos que muitas outras frentes de ação estão por vir. Contudo, para nós, o trabalho de formação tem que tanto respeitar a autoria do trabalho das professoras, quanto favorecer a troca constante e a ampliação dos horizontes de possibilidades (BAHKTIN, 2003), pensando com o cotidiano da escola (GARCIA, 2003) as concepções de infância, de escola, de sistemas de ensino, de avaliação...

Refletindo sobre o nosso papel nesta sociedade pós-moderna (SANTOS, 2002), o sujeito, o outro, alteridade (SKLIAR, 2003)...

Com o olhar atento aos alunos e às suas famílias percebemos que apesar destes viverem na comunidade há muitos anos, têm mantido uma relação superficial com a escola, sendo esse espaço visto e sentido como não pertencente a eles. Como forma de minimizar esse distanciamento e de trazer para a escola a comunidade, vimos desenvolvendo um trabalho de aproximação com as famílias através de encontros com mães de alunos, alunas e alunos da EJA e representantes da comunidade.

Os primeiros encontros aconteceram em maio deste ano por ocasião das comemorações do Dia das Mães, quando realizamos a 1ª Semana de Arte Materna, estabelecendo um contato diferenciado daquele em que geralmente os responsáveis são convidados a ir à escola para ouvir “queixas” sobre seus filhos, reuniões sobre comportamento e rendimento escolar.

Desses encontros surgiu o Clube de Mães da E. M. Cantagalo, que se constitui num espaço de troca, reflexão e debate entre mães e ETP acerca de questões relacionadas à Saúde e Sexualidade, Educação e Cidadania. Nossos encontros acontecem quinzenalmente com duração de 4 horas, divididas em dois momentos:

• oficinas de artesanato;

• debates sobre temas ligados à Saúde, Sexualidade (relações de gênero, prevenção de DST/AIDS), Educação e Cidadania.

Instigar o debate e a reflexão acerca de temas ainda ocultados ou negados pelos silêncios da escola e da família é uma das prioridades dos encontros do Clube de Mães. Tendo em vista o fenômeno da feminização da epidemia de AIDS no Brasil e o número elevado de novos casos de HIV/AIDS entre jovens e adolescentes, este tema tornou-se foco de debate em nossos encontros.

O aumento de casos de AIDS entre mulheres é observado estatisticamente desde 1980, no entanto, somente em 1994 o Programa Nacional de DST/AIDS se organiza para discutir as dimensões do problema. Durante mais de uma década a AIDS foi encarada pelo menos no imaginário social, como um fenômeno masculino (PARKER, 1996), o que levou a vulnerabilidade feminina frente ao HIV/AIDS a ser tratada de forma secundária pela maior parte das ações preventivas. Segundo dados

do Boletim Epidemiológico (2002) são as mulheres das classes populares, negras e pardas, casadas e monogâmicas que mais vêm se contaminando pelo HIV/AIDS nestes últimos anos.

Para pensar uma proposta de trabalho sistemático em prevenção a DST/AIDS voltada às mulheres é preciso trabalhar com as diferentes maneiras como a sexualidade vem sendo construída (SPINK, 2000) e com as condições sociais, culturais e psico-emocionais que tornam as mulheres mais ou menos capazes de se defenderem da epidemia, adotando práticas mais ou menos seguras de prevenção.

Esta ETP estabelece uma relação horizontal e dialógica com todos os sujeitos da comunidade escolar, considerando que o conhecimento se faz na práxis e em redes (ALVES, 2002), no intuito de favorecer a expressividade, a iniciativa, a construção coletiva e o diálogo. Toda a nossa ação está voltada para a construção do conhecimento emancipação, aquele que se opõe ao colonialismo (o outro como objeto), e busca a solidariedade e o caos (SANTOS, 2002).

Ficamos com as palavras de BRECHT (1982) que dentre tantas outras mensagens, nos instiga a olhar, a ver, a não aceitar a banalização e a naturalização daquilo que tem sido historicamente construído. Ele nos convida a manter nossos questionamentos e perplexidades ante a barbárie civilizada (LÖWY, 2000) que presenciamos cotidianamente: "Estranhem o que não for estranho. Tomem por inexplicável o habitual. Sintam-se perplexos ante o cotidiano." (BRECHT, 1982).

Referências bibliográficas:

ALVES, Nilda. Decifrando o pergaminho – o cotidiano das escolas nas lógicas das redes cotidianas. In: OLIVEIRA, Inês B. & ALVES, Nilda (org.). Pesquisa no/do cotidiano das escolas sobre redes de saberes. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.

ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. 2ª edição. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986.

AYRES, José R. de C. Mesquita. Cidadania, Vulnerabilidade e Prevenção de HIV/AIDS. In: PINTO, Teresinha & TELLES, Izabel da Silva (orgs.) AIDS e Escola: Reflexões e propostas do Educaids. São Paulo: Cortez; Pernambuco: UNICEF, 2000.

BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

BRECHT, Bertold. Antologia poética. 3ª edição. Rio de Janeiro, Elo Editora, 1982.

GARCIA, Regina Leite. A difícil arte/ciência de pesquisar com o cotidiano. In: Método Métodos

Contramétodos. GARCIA, R.L. (org.). São Paulo: Cortez, 2003.

LÖWY, Michael. Barbárie e modernidade no século XX. Porto Alegre. Fórum Social Mundial: dez, 2000.

NÓVOA, Antônio (org.). Vidas de Professores. Porto: Editora Porto, 2000.

PARKER, Richard & GALVÃO, Jane (orgs.). Quebrando o Silêncio: Mulheres e Aids no Brasil. Rio de Janeiro: Relume-Dumará: ABIA: IMS/UERJ, 1996.

PROGRAMA NACIONAL DE DST/AIDS (BRASIL). Boletim Epidemiológico AIDS. Ano XVI nº 1 – Abril a dezembro de 2002.

SARAMAGO, José. Ensaio sobre a cegueira. São Paulo. Companhia das Letras, 1995.

SANTOS, Boaventura Souza. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. São Paulo: Cortez, 2002.

SEGALA, Lygia & CALVÃO, Lea. (coord.). Bandas do além: almanaque de educação patrimonial. Niterói: PROEX, Fundação Euclides da Cunha, 2003.

SKLIAR, Carlos. Pedagogia (improvável) da diferença: e se o outro não estivesse mais aí? Rio de Janeiro: DP&A, 2003.

SPINK, Mary Jane. Da Vulnerabilidade feminina diante das DST/AIDS. In: PINTO, Teresinha &

TELLES, Izabel da Silva (orgs.) AIDS e Escola: Reflexões e propostas do Educaids. São Paulo: Cortez; Pernambuco: UNICEF, 2000.

(Texto publicado em mídia, FME-FSDE, 2005)

quarta-feira, 15 de junho de 2011

(Re)Descobrindo o bairro do Caju: história, memória e patrimônio
















Em abril de 2010 realizei a exposição de fotografias "(Re)Descobrindo o bairro do Caju: história, memória e patrimônio" na Creche Municipal Virgínia Lemos, localizada no Parque Alegria, onde atuava como diretora adjunta.

A exposição foi uma das ações desenvolvidas naquele ano que buscava resgatar a história do bairro a partir das memórias de seus moradores.


O projeto "(Re)Descobrindo o bairro do Caju: história, memória e patrimônio" teve início no ano de 2009 com oficinas voltadas para Recreadores e Agentes Auxiliares de Creche.


Para montar a exposição contei com o apoio de moradores que cederam fotos pessoais e que concederam entrevistas.



Na quarta semana do mês de abril comemora-se a Semana da Comunidade do Caju que foi instituída pela Lei n°5.146, de 7 de janeiro de 2010 http://mail.camara.rj.gov.br/APL/Legislativos/contlei.nsf/c8aa0900025feef6032564ec0060dfff/16c43624769762c003257706007313af?OpenDocument

(Fotos de Samantha Lobo)


Pescadores da Ponta do Caju

A Ponta do Caju já foi uma das mais importantes colônias de pescadores do Rio de Janeiro junto com a da Praça XV de Novembro.
Com a ampliação do Porto do Rio de Janeiro grandes áreas foram aterradas e com o tempo a pesca foi perdendo espaço.
A Revista Brasileira de Geografia, número 2, volume 20, de abril-junho de 1958 tráz um artigo muito interessante sobre o assunto - Pescadores da Ponta do Caju - Aspectos da contribuição de portugueses e espanhóis para o desenvolvimento da pesca na Guanabara.
Para acessar o conteúdo: http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/monografias/GEBIS%20-%20RJ/RBG/RBG%201958%20v20_n2.pdf .